quarta-feira, abril 05, 2006

Analisando: Lemonheads - Come On Feel The Lemonheads

O Lemonheads tinha a faca e o queijo na mão hora de lançar "Come On Feel The Lemonheads". A banda vinha de um disco de sucesso bem recebido pela crítica, com vendagem em alta, amplos espaços na mídia (se pelos motivos certos já é outra questão) e, principalmente, um punhado de grandes canções novas. Era só fazer a bolacha e partir pro abraço, mas a banda de Evan Dando bagunçou tudo.
O que era para ser uma consagração, com a conquista de um espaço definitivo acabou se revelando uma decepção, num baque que o Lemonheads nunca se recuperou completamente até o fim dos seus dias. Se muita gente até hoje não leva a música de Evan Dando a sério, muito se deve a "Come On Feel The Lemonheads", e mais precisamente às atitudes de Evan na época. Isso significa que o disco é um desastre? Não, até longe disso, as grandes canções estão lá. Mas simplesmente o disco não funciona como um todo, com uma série de momentos dispensáveis e idéias mal-acabadas. Isso se revela de forma mais gritante a partir da segunda metade do disco, que exige uma boa dose de paciência do ouvinte.


"Come On Feel" começa muito bem, com uma seqüência de boas músicas. Os semi-hits estão todos no início, o pop rock certeiro de "The Great Big NO" e a singela "Into Your Arms".

A balada "It's About Time", já testada e aprovada na estrada bem antes de entrar no disco e a veloz mas não furiosa "Down About It" são outros dois grandes momentos. "Paid To Smile" tem belos versos, mas o refrão não segura e o final é meio entediante. Como várias faixas do disco, conta com a participação do vocal meigo de Juliana Hatfield, que foi um diferencial no álbum anterior do Lemonheads, mas em "Come On Feel" traz alguns momentos duvidosos.
"Big Gay Heart" é uma balada ao violão com guitarra steel. Foi até lançada como single, embora a temática restritiva da letra. A música é boa e o trecho "Do you have to try to piss me off 'cause I'm easy to pleeeeeease" culminando com a quebrada na bateria é especialmente marcante, mas o refrão é uma martelada, quase uma lavagem cerebral. Repete "big gay heart" em versinhos tolos nada menos que dezesseis vezes. Um pouco demais não?

"Style" é a música mais queima-filme do disco, falando abertamente do uso de drogas do vocalista. "Don't wanna get stoned / but I'm not wanna not get stoned" dá a idéia de como andava a relação de Evan Dando as drogas na época. Aliás, em cada um dos três últimos discos do Lemonheads há uma música sobre drogas. Enquanto a primeira, "My Drug Buddy" era uma verdadeira declaração de amor, "Losing Your Mind" (de Car Button Cloth, de 1996) foi o último capítulo, gravado direto do fundo do poço. A entorpecida "Style" está no meio do caminho. Revela o impasse na letra que não sai do lugar. (=prisão?)

"Rest Assured" é mais um rock, não tão bacana quanto "Down About It", mas dá o seu recado. A divertida "Dawn Can't Decide" cruza a fronteira entre a boa-intenção de soar espontâneo e o feito "nas coxas", com letra improvisada e um tanto sem sentido, soando descartável. "I'll Do It Anyway" é daquelas canções meiguinhas de Evan Dando. No refrão, Evan divide os vocais com Juliana Hatfield numa linha bem Leno & Lilian, Luan & Vanessa ou algo que o valha. Pareceu caricato, forçado.

O disco perde o pique de vez com a repetição de "Syle", rebatizada como "Rick James Style" em uma versão chatíssima em câmera lenta, que conta com a participação de (adivinhou?) Rick James. James foi músico funk de muito sucesso nos EUA durante os anos 70/80 mas enfrentou problemas judiciais por uso de drogas que interromperam sua carreira por diversas vezes. Infelizmente, a participação dele no disco do Lemonheads pesa apenas como curiosidade e pouco contribui para evitar o skip para a próxima faixa.

De qualquer forma seria difícil levantar o disco depois da segunda "Style" e a tarefa coube a simpática "Being Around". De letra bobinha e engraçada, talvez "Being Around" funcionasse bem em outro contexto mas aqui soa dispensável. Dá a impressão de fórmula gasta, é mais uma canção leve de violão com guitarra steel acompanhando. Na seqüência, mais violão (sem a guitarra desta vez) surge com "Favourite T", a balada mais delicada e emocionada do disco, com Evan cantando baixinho próximo ao microfone. "Favourite T" é mais uma prova de como Evan Dando não levou a sério esse disco, a letra é uma verdadeira ode a sua... camiseta favorita.

"You Can't Take It With You" é o último lampejo do disco, com um arranjo interessante de guitarra e uma melodia verdadeiramente boa. Até que desacelera, engasga e entre risos Evan Dando manda ver um encerramento com uma letra de auto-ajuda sarcástica de gosto duvidoso. Não teve graça, Evan.
Acabou? Ah, sim. Ainda temos "The Jello Fund", com seus 15 minutos de duração de tédio entre brincadeiras ao piano, pitadas de hard rock e barulhinhos de estúdio.

É difícil não ouvir Come On Feel sem ficar com a impressão de algo incompleto, mal-acabado. Poderia ter sido um grande disco mas ficou no meio do caminho, e no final das contas é apenas um punhado boas músicas perdidas no meio da bagunça que se tornou a carreira do Lemonheads na época.

by Limão Covizze

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